Chá com Letras Online: Canto-LEITURAS DE IRENE LISBOA XIII


LEITURAS DE IRENE LISBOA XIII
197.º ENCONTRO
Selecção de Maria José Areal


Texto V
Peguei nesta pena e olhei esta folha de papel tão grande que me parece que jamais terei com que a encher… e veio-me um desejo infantil de me livrar de mim mesma, de me esquecer de como vivo e de como sou, de deixar de me sentir o meu eterno centro e periferia… É um desejo de ruptura de certa coisa permanente, invisível, em mim; de um estado moral nefasto.
Lembro-me de que ontem a esta hora sentia o peito esmagado. E ainda hoje me sinto cansada.
Tenho ali umas violetas. Gostava de as copiar, de amassar o barro ou de cortar a pedra. De me demorar a imitar a forma. Escrever não é o mesmo, não tem em si nenhuma exterioridade, nem calma.
A hora vai entristecendo, vejo-o na casa. O sol já mudou de janela.
IRENE LISBOA, “SOLIDÃO”, Notas do punho de uma mulher, Volume II- pág. 16, Editorial Presença, Lisboa, 1992




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