Chá com Letras Online: Canto-LEITURAS DE IRENE LISBOA IX



LEITURAS DE IRENE LISBOA IX
193.º ENCONTRO
Selecção de Maria José Areal

COISAS POUCAS II
Estava sentada numa cadeira, com as mãos ocupadas, quando noto que o relógio se põe a bater com mais força e até com mais rapidez. Parece querer precipitar o tempo, empurrar o dia; diz-me que espere que não espere, que esta hora é vã, esta e todas as mais que passaram.
Só por dar atenção a um som monótono e invariável me vieram estas sensações. O relógio recebia o meu pensamento e brandia-mo com uma certa graça melancólica… Sorri.
O pensamento fora de nós, emprestado às coisas, materializa-se, individualiza-se, e nós sorrimos-lhe porque o riso é o gesto mais pronto e comunicativo que temos para estabelecer sociedade.
IRENE LISBOA, “Coisas Poucas”, pág., 94 - FOLHAS SOLTAS DA SEARA NOVA, (1929 – 1955) Antologia, Prefácio e Notas de Paula Morão, edição Biblioteca de Autores Portugueses – Abril 1986



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