Chá com Letras Online: 4 de julho - LEITURAS DEJOSÉ SARAMAGO VI



LEITURAS DE JOSÉ SARAMAGO VI
86.º ENCONTRO
Selecção de Maria José Areal


4 de julho

Resposta ao leitor António Bachara, de Buenos Aires:
“A sua carta surpreendeu-me, não tanto por causa da questão principal de que trata, a homossexualidade, mas pela estranheza que mostra por, segundo as suas próprias palavras, ter eu evitado ou omitido o tema sistematicamente, dos meus livros. Em primeiro lugar, tenho sempre, no meu trabalho, o cuidado elementar de só escrever sobre o que sei ou está ao meu alcance saber. Por exemplo, nunca um rico foi personagem meu pela razão simples de que não sei o que é um rico. Compreende o que quero dizer? Poderá argumentar que, não sendo mulher, também não deveria poder falar de mulheres. A diferença está em que, pelo menos, creio conhecer algo delas. Embora tenha amigos homossexuais, a quem respeito e considero como amigos, não sei deles o suficiente para presumir de conhecê-los como homossexuais. São amigos, e isso me basta. E até hoje nenhum deles me perguntou por que não há homossexuais entre os meus personagens…
Não entendo o que quer dizer quando se refere ao “papel do homossexual”. Em minha opinião, o (ou a) homossexual não tem qualquer “papel” específico: como ser humano, o seu “papel” é ser o mais “humano” possível, independentemente de qualquer opção sexual. Que os homossexuais são descriminados, é uma triste verdade, mas também o são, de distintos modos, todos os diferentes, começando pelos máximos descriminados, que são os pobres. E os pobres são os únicos que nunca se comportaram como uma seita de qualquer tipo: são demasiado numerosos para isso…”
JOSÉ SARAMAGO – Último Caderno de Lanzarote – O diário do ano Nobel, 4 de julho, págs. 143/144, 1.ª edição- 2018, Fundação José Saramago e Porto Editora.



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